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AS MÁSCARAS DE CRISTINA VALADAS
A partir do momento em que o ser humano passou a olhar na verticalidade, já não lhe bastava observar a própria natureza. Tinha também de compreendê-la, e para isso apropriou-se dela através da efabulação, isto é, da representação e interpretação de símbolos ou de papéis. Quer isto dizer que a máscara nos permitiu e continua a permitir sermos nós e ao mesmo tempo experimentarmos ser outros, dominarmos os medos e descobrirmos os prazeres das artes através da dança, do canto e da pintura.
Assim é também a obra de Cristina Valadas. Uma obra cheia de viagens por outros mundos e com uma enorme capacidade de efabulação. O resultado está ao alcance dos nossos olhos, das nossas mãos e da nossa sensibilidade.
Refiro-me às maravilhosas metáforas visuais a que a artista nos tem acostumado, mas também à enorme versatilidade que caracteriza essas metáforas e que é transversal a toda a sua obra. Cristina Valadas pinta e também entra, com um domínio perfeito, no universo do tridimensional, quer na construção das personagens, quer na sua execução artística, e o exemplo disso é esta exposição de máscaras, pássaros e bonecas que nos fazem entrar em mundos mágicos e abraçar a natureza das coisas que estão para além do que os nossos olhos vêm.
Adélia Carvalho
Usada, desde a sua criação, em momentos tão diversos como rituais religiosos, de guerra, de fertilidade da terra ou da mulher, ou em atividades lúdicas e artísticas, a máscara é um elemento simbólico de linguagem cénica. A natureza da máscara pede a sua integração numa cena, e essa natureza mantém-se ainda que simplesmente as contemplemos e dialoguemos com ela. Como representa intrinsecamente carateres humanos, animais ou sobrenaturais, a máscara integra-se naturalmente numa cena ou em cenas imaginadas e inventadas por quem a interpela. Ela nasceu e continua a nascer da necessidade de compreender e representar o mundo.
As máscaras de Cristina Valadas contêm toda uma carga de performatividade que as liga indissoluvelmente a essa ideia de movimento, ação, conflito e materialização de forças invisíveis; são uma criação individual, mas existem para ser apreciadas por todos. Nelas lemos sentimentos e emoções de todo o tipo que nos devolvem imagens de nós próprios, quer enquanto seres individuais e únicos, quer enquanto sociedade que partilha um património mental, espiritual e material comum.
O belo, mesmo quando remete para o que numa determinada cultura é considerado feio, disforme e repulsivo, existe em variadíssimas formas, propõe múltiplas interpretações e suscita reações muito distintas. O belo artístico é comunicação e civilização. As máscaras de Cristina Valadas são uma manifestação do belo.
Carlos Nogueira